Quatro moradores de rua se preparavam para dormir no domingo quando foram agredidos por grupo extremista "Surgiram do nada", relata uma das vítimas; cinco agressores estão presos sob suspeita de tentativa de homicídio
Da esq. para dir., Aline e Júlio César, que não quiseram mostrar o rosto, Carlos e Samuel ELIANE TRINDADE
DE SÃO PAULO O ataque foi inesperado. "Os caras surgiram do nada, xingando a gente de preto, pobre e nordestino e dando socos e pontapés", diz Samuel de Oliveira, 34, branco, nascido em Passos (MG).
Um dos quatro moradores de rua atacados por skin- heads na madrugada do domingo em São Paulo, ele afirma que, além dos cinco jovens presos, outros quatro participaram das agressões.
"Duas mulheres eram da gangue. Tinha uma menor e a namorada de um dos caras", diz Aline de Souza, 21.
Ela escapou da pancadaria abraçada ao marido, Júlio César Souza, 20. Ele, negro, levou golpes nas costas, mas conseguiu proteger a mulher, grávida de três meses.
As quatro vítimas se preparavam para dormir na fria madrugada de domingo sobre leitos de papelão na praça do Paraíso, em frente à igreja Ortodoxa, na zona sul.
"Eles vieram para matar", diz Carlos Eduardo Carvalho, 31. Ele conta ter tentado parar as agressões na conversa.
Não adiantou. "Deus mandou pra cá naquela hora policiais treinados para combater esse terrorismo burro", diz Carvalho, ex-pastor e negro. Até chegar reforço, os skinheads foram para o confronto com dois policiais que fizeram o flagrante. Dois tiros para o alto os contiveram.
Mesmo rendido, um deles continuou com xingamentos racistas, afirmam as vítimas.
"No chão, o folgado gritava que odiava negro. Um dos policiais também era preto", diz Samuel, que, sob a ameaça de um facão, chamou a atenção do carro de polícia que passava pelo local.
A polícia apreendeu um arsenal de armas brancas: três machados, quatro facas, um punhal e um facão.
Segundo as vítimas, os agressores pareciam muito alterados e levavam com eles duas garrafas de vodca.
Os quatro sem-teto vivem numa autodenominada "comunidade democrática de rua", que tem hoje 17 integrantes. Eles tiram o sustento da venda de material para reciclagem. Carlos faz bicos como entregador de água mineral para uma distribuidora vizinha à praça do Paraíso.
"Eles trabalham e vivem bem na rua. Comem, bebem e dormem sem pagar imposto", diz o comerciante Tiago Fernandes, que usa os serviços de dois sem-teto.
"A gente não é de luxo, mas gosta do que é bom", afirma Carlos, que tira R$ 20 por dia com as entregas.
No sábado, para encarar o frio, optaram por vinho tinto e seco. Um malbec embalou a confraternização à base de feijoada, que começou às 18h e foi até as 23h.
Ainda assim, o grupo não cogita procurar abrigos para se proteger da violência.
"No albergue, o cara é prisioneiro da própria situação. Tem que ficar quatro horas na fila para pegar senha para dormir e outras tantas para comer. Quando é que a pessoa trabalha?", indaga Carlos. "Gastam muito dinheiro, mas sem efetividade."
Marlene Bergamo/Folhapress |
DE SÃO PAULO O ataque foi inesperado. "Os caras surgiram do nada, xingando a gente de preto, pobre e nordestino e dando socos e pontapés", diz Samuel de Oliveira, 34, branco, nascido em Passos (MG).
Um dos quatro moradores de rua atacados por skin- heads na madrugada do domingo em São Paulo, ele afirma que, além dos cinco jovens presos, outros quatro participaram das agressões.
"Duas mulheres eram da gangue. Tinha uma menor e a namorada de um dos caras", diz Aline de Souza, 21.
Ela escapou da pancadaria abraçada ao marido, Júlio César Souza, 20. Ele, negro, levou golpes nas costas, mas conseguiu proteger a mulher, grávida de três meses.
As quatro vítimas se preparavam para dormir na fria madrugada de domingo sobre leitos de papelão na praça do Paraíso, em frente à igreja Ortodoxa, na zona sul.
"Eles vieram para matar", diz Carlos Eduardo Carvalho, 31. Ele conta ter tentado parar as agressões na conversa.
Não adiantou. "Deus mandou pra cá naquela hora policiais treinados para combater esse terrorismo burro", diz Carvalho, ex-pastor e negro. Até chegar reforço, os skinheads foram para o confronto com dois policiais que fizeram o flagrante. Dois tiros para o alto os contiveram.
Mesmo rendido, um deles continuou com xingamentos racistas, afirmam as vítimas.
"No chão, o folgado gritava que odiava negro. Um dos policiais também era preto", diz Samuel, que, sob a ameaça de um facão, chamou a atenção do carro de polícia que passava pelo local.
A polícia apreendeu um arsenal de armas brancas: três machados, quatro facas, um punhal e um facão.
Segundo as vítimas, os agressores pareciam muito alterados e levavam com eles duas garrafas de vodca.
Os quatro sem-teto vivem numa autodenominada "comunidade democrática de rua", que tem hoje 17 integrantes. Eles tiram o sustento da venda de material para reciclagem. Carlos faz bicos como entregador de água mineral para uma distribuidora vizinha à praça do Paraíso.
"Eles trabalham e vivem bem na rua. Comem, bebem e dormem sem pagar imposto", diz o comerciante Tiago Fernandes, que usa os serviços de dois sem-teto.
"A gente não é de luxo, mas gosta do que é bom", afirma Carlos, que tira R$ 20 por dia com as entregas.
No sábado, para encarar o frio, optaram por vinho tinto e seco. Um malbec embalou a confraternização à base de feijoada, que começou às 18h e foi até as 23h.
Ainda assim, o grupo não cogita procurar abrigos para se proteger da violência.
"No albergue, o cara é prisioneiro da própria situação. Tem que ficar quatro horas na fila para pegar senha para dormir e outras tantas para comer. Quando é que a pessoa trabalha?", indaga Carlos. "Gastam muito dinheiro, mas sem efetividade."