Artista americano de 84 anos explora até hoje temas tidos como subversivos, usando imagens fugidias
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SILAS MARTÍ
DE SÃO PAULO
No dia em que os jornais amanheceram falando do corpo mumificado de Yvette Vickers, atriz de filmes B dos anos 1950 que apodreceu em casa, na Califórnia, Kenneth Anger veio a São Paulo para um festival de seus filmes.
A morte parece acompanhar esse cineasta. Ele não sabia de Vickers, que encarnou a gigante de 15 metros que apavorava o trânsito, mas conta que Elliott Smith, cantor sobre quem fez um documentário, se matou logo depois de concluído o filme.
Donald Cammell, que fez o deus Osíris num filme de Anger sobre o demônio, também se suicidou pouco depois com um tiro na cabeça. Um lenço de seda à guisa de curativo improvisado por Anger evitou que a amiga Marianne Faithful morresse num surto suicida, ao cortar os pulsos durante um jantar na casa de Mick Jagger.
Não foi à toa que o cineasta foi convidado para escrever o prefácio de um livro sobre suicídios de celebridades.
"Isso não acontece o tempo todo", diz Anger, 84, à Folha. "Mas me consideram um especialista nisso." Esse submundo, lado negro da Hollywood onde mora, serve de motor para a obra do artista. Seus curtas, agora reunidos num festival no Centro Cultural Banco do Brasil, refletem impressões fugazes de contornos escorregadios.
E isso ele aprendeu longe de seu maior objeto de estudo. Anger trocou uma Hollywood paranoica com o comunismo nos anos 1950 para trabalhar na Cinemateca Francesa, em Paris.
Começou fazendo curtas em preto e branco sobre fantasias sexuais obscuras, com efeitos de luz barrocos e muito sangue cenográfico, vendo na morte pulsão criativa. Já nos anos 1970, mergulhou no universo de motoqueiros e mitos do rock em filmes de cor estridente e forte carga de subversão sexual.
São temas que ele não abandona mesmo agora. Em dois filmes mais recentes, restaura imagens de arquivo da juventude nazista e de velhos dirigíveis, dando novas cores às imagens esmaecidas e operando um resgate visual da erosão dos mitos.
Seu próximo projeto é voltar ao Egito, onde esteve cinco vezes, para fazer um filme sobre as cinzas da revolução. Mas vai desviar o foco dos humanos para os camelos, que morrem de fome em épocas sem turistas. "Quero examinar esse fenômeno."
KENNETH ANGER
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