quinta-feira, 3 de maio de 2012

Ex-delegado Cláudio Guerra afirma que corpos de dez desaparecidos foram queimados em usina no Rio

DE SÃO PAULO
DO RIO
Em livro lançado ontem, o ex-delegado capixaba Cláudio Guerra, 71, afirma ter participado da morte de ao menos 12 guerrilheiros e incinerado os corpos de outros dez desaparecidos políticos na ditadura militar (1964-85).

O depoimento está em "Memórias de uma Guerra Suja" (Topbooks), dos jornalistas Marcelo Netto e Rogério Medeiros. Guerra diz ter decidido confessar os crimes após se tornar pastor evangélico. Ele também promete depor à Comissão da Verdade.

Segundo o relato do ex-policial, os 10 corpos teriam sido queimados no forno de uma usina de açúcar pertencente à família do ex-governador do Estado do Rio Heli Ribeiro Gomes.

"Fui responsável por levar dez corpos de presos políticos para lá, todos mortos pela tortura", afirma.

Ele cita entre essas vítimas David Capistrano, João Batista Rita, Joaquim Pires Cerveira, João Massena Mello, José Roman e Luiz Ignácio Maranhão Filho, do PCB (Partido Comunista Brasileiro).

Completam a lista: Ana Rosa Kucinski e Wilson Silva, da ALN (Ação Libertadora Nacional); Joaquim Pires Cerveira, da FLN (Frente de Libertação Nacional); Eduardo Collier Filho e Fernando Augusto Santa Cruz Oliveira, da APML (Ação Popular Marxista-Leninista).

O paradeiro desses desaparecidos políticos nunca foi informado às famílias.

Filha do ex-governador do Heli Ribeiro Gomes, Maria Cecília Ribeiro Gomes, 55, reagiu com indignação. "Estou estarrecida. Isso é uma acusação maluca, sem cabimento. Uma loucura da cabeça desse homem", diz ela, que acaba de deixar o cargo de secretária de Trabalho de Campos.

"Trabalhavam mais de três mil funcionários na usina. Como alguém poderia levar corpos para lá, fazer uma barbaridade dessas, e ninguém ver?"

Entre os guerrilheiros que Guerra diz ter executado pessoalmente estão Nestor Veras, do PCB, e Manoel Aleixo da Silva, do PCR (Partido Comunista Revolucionário).

O livro relata a existência de três cemitérios clandestinos em São Paulo, Belo Horizonte e Petrópolis (RJ).

Guerra afirma ter participado também de atentados para tentar retardar a redemocratização do país, entre eles o do Riocentro, em 1981.

O livro vincula os autores desse atentado à morte do jornalista Alexandre Von Baumgarten, em 1982.

O ex-policial ainda diz que a morte do delegado Sérgio Paranhos Fleury, um dos chefes da repressão, teria sido tramada pelo Cenimar (Centro de Informações da Marinha). A versão oficial é de morte acidental no mar.

O livro identifica Guerra como agente do Dops (Departamento de Ordem Política e Social). O ex-delegado cumpriu pena de sete anos pela morte de um bicheiro no Espírito Santo, crime que ele nega. Há contra ele também acusação de participação em grupo de extermínio nos anos 80.

A presidente do grupo Tortura Nunca Mais no Rio, Vitória Garbois, disse que recebeu o livro com "perplexidade". "Essa pessoa nunca apareceu nas listas de agentes da repressão." Ela defendeu que os relatos sejam investigados.

A ministra Maria do Rosário (Direitos Humanos) disse que a Comissão da Verdade deve analisar "esse e todos os demais relatos" do período.

AMIGOS...